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It Follows: Sexo, violência e paranoia

Atualizado: 29 de out. de 2020


Após um encontro sexual, Jay Height (Maika Monroe) começa a ser perseguida por algo. Não há uma forma definida: pode parecer um homem, uma mulher, criança ou idosa, alguém que lhe é familiar ou um completo estranho. A única coisa consistente é que a coisa está sempre a segui-la, a caminhar, sempre sem parar, e quando chegar perto da sua vítima, ela está morta.


It Follows é o filme de David Robert Mitchell, baseado num pesadelo recorrente que o diretor tinha em criança. O filme é um exercício em suspense e paranoia, graças à implacabilidade do monstro da história. Há algo de arrepiante em saber que algo nos está a perseguir, mesmo que lentamente, sabendo sempre onde estamos, que apenas nós conseguimos ver. A coisa acaba por ser semelhante a uma força da natureza, irreverente, incompreensível e imparável.

Um dos sustos mais eficazes é quando Jay se tranca no seu quarto, depois de pensar que viu a coisa que a persegue. Após ouvir alguém bater à porta, Jay pega em algo para se defender e abre a porta, e vê apenas a sua amiga. Por um segundo pensa que está segura, mas o monstro, agora na forma de um homem de dois metros sem olhos, sai da escuridão por detrás da amiga, calmo, como se nada se passasse. Não há nada na sonografia que anuncia a chegada dele, apanhando o público de surpresa. É uma excelente maneira de assustar um público que já está habituado a ver filmes e já reconhece os sinais de que algo aterrorizante vai acontecer.


Aliás, o filme pode ser considerado não como um filme de terror, mas um filme de paranoia. O terror acaba por vir do público, que não consegue relaxar sabendo aquilo que sabe sobre o monstro. Em alguns planos, Mitchell põe alguém a aproximar-se das personagens principais no fundo, a caminhar lentamente, sem que nenhuma das personagens se aperceba dela. Fica implícito que esta pessoa é a coisa, e aumenta o suspense no público, que agora sabe algo que as personagens não sabem. O uso de panning shots também ajuda a manter a tensão, ao mostrar-nos um grande espaço, sem nunca dar muito foco a algo em específico. Alguém atento pode aperceber-se de certas pessoas a caminhar lentamente numa direção, mas como a câmara recusa-se a dar foco em algo específico, ficamos com a ideia que pode ter sido apenas nossa imaginação.


Isto não quer dizer que o filme não cai em esparrelas habituais de terror. A coisa parece tomar o seu tempo com a heroína, mas com outras vítimas acaba por fazer o seu trabalho incrivelmente rápido. A cena da praia é um bom exemplo disto. A coisa aproxima-se de Jay, sem ela o ver, e limita-se a brincar com o cabelo dela, quando para outras vítimas a morte é instantânea. Retira algum poder à premissa de algo implacável nos querer matar, e não haver nada que possamos fazer para a parar. Também acho que a coisa poderia ter tomado a forma de conhecidos mais vezes, para aumentar ainda mais a paranoia.


Já vi duas interpretações diferentes do filme. A primeira é que é uma metáfora para doenças sexualmente transmissíveis e violência sexual. Faz sentido, dado o elevado ênfase do sexo na narrativa, como a transmissão da maldição da coisa, e é implícito que a coisa mata as suas vítimas através do sexo. Sexo e violência estão sempre interligados no filme, tanto nas grandes cenas como nos pequenos detalhes. A outra, que não se mistura bem com toda a estética sexual, mas que acho muito interessante, é que a coisa representa a mortalidade. Está sempre lá, sempre atrás de nós, sem grande possibilidade de a evitar ou parar, e que é melhor aceitar isso e viver apesar da morte poder estar ao virar da esquina.


It Follows é uma história interessante, sem dúvida, e um excelente exercício em criar paranoia e insegurança naqueles que a veem. Porém, há vezes em que as regras estabelecidas são ignoradas para que o filme continue, algo que me desaponta num filme que parece ter sido tão bem pensado. Mesmo assim, recomendo. São duas horas que, se não aterrorizarem, pelo menos vos vão deixar desconfortáveis e a olhar por cima do vosso ombro, a ver se alguém está atrás.


Filipe Melo

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