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Atualizado: 16 de mar. de 2021



Três anos depois de “Dunkirk”, Christopher Nolan regressa aos cinemas com “Tenet”, e desta vez com um orçamento explosivo que lhe permitiu fazer virtualmente aquilo que quisesse. “Tenet” já estava na mente de Nolan há cerca de 20 anos, mas começou apenas a escrever o argumento há cinco anos e para executá-lo, reuniu uma equipa fantástica, da qual se conta com o cinematógrafo Hoyte van Hoytema (que trabalhou com Nolan em “Interstellar” e “Dunkirk, para além dos filmes “Her” e “Ad Astra”), e o compositor Ludwig Göransson (“Creed: O Legado de Rocky” e “Black Panther”) que substituiu o habitual colaborador de Nolan, Hans Zimmer. Num ano de pandemia, “Tenet” é referido como o filme que irá salvar os cinemas da crise que a indústria vai sofrer, mas será que vale a pena? Após a análise ao trailer, passa-se à crítica ao filme, e para evitar qualquer spoiler, o enredo não será aprofundado.


Já todos nos habituamos à paixão e talvez obsessão de Christopher Nolan em manipular a mente e os conceitos que temos como certos e imutáveis. Desde a manipulação da nossa noção da passagem do tempo em “Memento” e na estrutura narrativa de “Dunkirk”, a capacidade expansiva da dimensão onírica em “Inception” ou a perceção do espaço em “Interstellar”, é facilmente notável que estes são os temas que acordam Nolan durante a noite e o deixam a matutar sobre qual a melhor forma que ele próprio tem como explorar estes conceitos, e simultaneamente associá-los à sua paixão cinemática. Para aprofundar estas ideias, Nolan pegou no género de espionagem e decidiu adicionar a sua forma de realizar à equação. Apesar de não ter referido que filmes ou realizadores foram as influências mais diretas para “Tenet”, quase que podemos adivinhar que os filmes da saga “James Bond” serão alguns deles, não do galã Sean Connery ou do cómico Roger Moore mas do sério Daniel Craig. A estes podemos juntar os próprios trabalhos de Nolan, “Memento” e “Inception” e em certas alturas senti que haveria alguma influência de “Primer” de Shane Carruth, possivelmente um dos mais complexos e complicados filmes da história. Assim, o Protagonista do filme (com “P” maiúsculo pois este é o nome com que o conhecemos) entra no mundo da espionagem com a missão de impedir a Terceira Guerra Mundial. É assim que se resume o enredo, evitando falar de algo mais. O filme tem uma cadência alucinante, os primeiros momentos são, na minha opinião, demasiado acelerados, para podermos passar à ação rapidamente, como o tutorial de um jogo que se vai avançando a fim de finalmente o poder jogar. O que Nolan perde com estas sequências iniciais, onde vai desperdiçando grandes atores que apareceram apenas para dizer “olá” quase, compensa com ação dotada de uma imensa criatividade que apenas os filmes de ficção científica conseguem atingir. Estas sequências de ação são fantásticas e quase me fazem desejar que o filme se prolongasse ainda mais, e que me fazem esperar que saia um director’s cut onde as minhas preocupações relativamente ao início e os meus desejos por mais espetacularidade sejam satisfeitos. Talvez “Tenet” seja já a versão final feita por Nolan com total liberdade, mas uma pessoa pode sonhar. E quando falamos de Nolan, aquilo que as audiências esperam é a experiência surpreendente que as impede de fazer qualquer previsão correta da conclusão do filme. No entanto, não irão ter isso, vi muitas críticas que falavam da incompreensibilidade da mecânica do mundo que Nolan criou em “Tenet”, porém a exposição é feita da forma que eu desejava que tivesse sido feita em “Inception”, dão-nos as regras e depois permitem à audiência que tente compreender o que se está passar (em vez de aproveitar todos os momentos para explicar o que se está a passar), e por isso durante a experiência cinemática, vamos pensando nas implicações que todos os eventos terão na matriz do tempo mas nunca saltamos da cadeira por termos acabado de ver acontecimentos absolutamente bizarros que vão completamente contra a linha lógica que fomos traçando e por isso emocionam por sentirmos a nossa mente a ser manipulada, algo que muitos poderão acabar por ficar desapontados e levará a afirmações como “Não é nada de espetacular do Nolan” que ignoram por completo o quão empolgante é ver o desenrolar dos eventos e a forma como foram criados. Além disso, tenho a certeza de que uma segunda ou terceira visualização são necessárias para realmente tirar o sumo todo e reparar nos pormenores que tornam “Tenet” num trabalho bastante consistente. Já para não falar da reflexão que nos possibilita relativamente à nossa perceção humana do tempo e de como respondemos às questões filosóficas que são os paradoxos temporais.



Quanto às atuações, inicialmente, estava com dúvidas quanto a John David Washington, e, nos primeiros minutos, questionei-me se ele seria a escolha acertada para ser o Protagonista, mas a verdade é que ele acabou por dominar o papel e criar a presença que a sua personagem merecia. O mesmo pode ser dito de Elizabeth Debicki, cuja personagem é a mais emocional do filme, num trabalho que por vezes procura ser tão frio e focado na ação que se esquece que as motivações das personagens dependem muito das suas emoções, uma das grandes falhas de “Tenet”, na minha opinião. E esta falha emocional está presente muitas vezes no argumento, em que os diálogos em certas alturas se tornam genéricos ou simplesmente frases soltas sem muita ligação àquilo que seria a comunicação real caso estas eventos fossem do nosso domínio da realidade. O foco de Nolan é a criação de uma experiência orgânica e intelectual, mas o facto de querer desprender-se de sentimentalismo dissocia-se daquilo que é o seu trabalho final, pois parece que Nolan pretendia usar as personagens como objetos para este fim, mas nunca deixa de olhar para as suas personagens como humanos, o que cria uma certa discordância relativamente ao que se procurou fazer e como acabou por ser feito. Outras atuações, nomeadamente a de Robert Pattinson e Kenneth Branagh, eram por vezes dotadas de uma presunção excessiva, algo muito proeminente nos filmes recentes de ação, mas que aponto como uma única lacuna em performances que de resto são simplesmente de excelência.


Espero, porém, que estas críticas não vos retirem qualquer vontade de ver este filme. É um trabalho bastante sólido, emocionante, original e intelectualmente estimulante. As imagens ainda estão na minha mente e deixam-me com alguma curiosidade relativamente à forma como o tempo opera. Se é o melhor filme que Christopher Nolan criou? Sem dúvida que não, especialmente porque falamos do homem que criou os excelentes “Memento” e “O Cavaleiro das Trevas” que são marcos do cinema. Mas é o filme fraco que parece que destoa no conjunto das obras de Nolan? Nem pensar, mais do que isso, é uma boa adição que solidifica o seu estatuto como aclamado realizador. Existem algumas falhas que gostaria de ter visto resolvidas, mas que nunca me impediram de aproveitar o mais recente de Christopher Nolan e de o querer revisitar no futuro.


Manuel Fernandes

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